terça-feira, 19 de março de 2013

CRIATIVIDADE NA ESCOLA


Vejamos a seguinte situação:

O professor X propõe um desenho sobre um determinado tema. Mais tarde, após examinar os desenhos feitos por seus alunos, o professor diz que faltou “criatividade” e “originalidade” nos trabalhos da turma.

Será que o professor está correto em seu julgamento? Será que os alunos não tiveram mesmo criatividade e que seus desenhos não foram originais? Para responder a estas questões é preciso que se conheçam os dois lados: o do professor X e dos alunos. 

O professor X é um adulto. Cresceu numa família e aprendeu coisas com ela. Passou por várias escolas e, pelo menos, uma Universidade antes de lecionar. Conviveu com vários outros grupos sociais (amigos, igreja, clubes, de trabalho,...) e vive numa macro sociedade. Em cada grupo social entrou em contato e incorporou pensamentos que passaram a fazer parte de sua cultura pessoal. Por isso, quando o professor X pensa em criatividade, significa que ele deseja originalidade, variedade, facilidade e fluência de ideias em relação a tudo o que se quer fazer.

Os alunos, por sua vez, não trazem toda essa bagagem cultural. Pertencem a um grupo familiar que lhes ensina hábitos e costumes. Com a entrada na escola, começam a ampliar seus conhecimentos dando início á formação de sua cultura pessoal, aos poucos. Por isso, ao ouvirem o pedido e a explicação da tarefa, os alunos começam a pensar em como realizar o tal desenho. Pensam no tema proposto e na melhor forma de traduzi-lo numa expressão gráfica.

Enquanto pensam, buscam na memória situações e imagens relacionadas com o tema. Vasculhando a memória, se defrontam com experiências e vivências de seu próprio eu. Experiências e vivências que podem ter sido positivas ou negativas dependendo do seu histórico de vida. Estas imagens são como “pontos de ancoragem” (como diz Ausubel), ou seja, “referência significativa” e própria do seu conhecimento em formação.

Neste momento, cada aluno faz uma escolha e podem optar por colocar no papel imagens e situações que lhes são agradáveis, deixando escondidas as desagradáveis. Ou vice-versa, porque o contrário também é verdadeiro.

Seja qual for a escolha feita, os alunos começam a realizar a tarefa. Os desenhos sempre retratam o que foi mais importante ou significativo, naquele momento. E enquanto desenham, os alunos fazem novas escolhas e tomam novas decisões: a imagem principal, as imagens secundárias, outras imagens que completam a cena, geralmente de menor importância para eles.

A composição realizada traz, ainda, a experimentação e a exploração o espaço do papel, o descobrimento de novas possibilidades e pontos de vista diferentes e os conceitos de cada aluno sobre o tema.

Chega o momento do toque final de sua obra: o colorido. Novas escolhas feitas e decisões são tomadas. As cores utilizadas em cada imagem ainda estão ligadas a seus conhecimentos, experiências, vivências, reações emocionais e das possibilidades de conhecimento de mundo que cada um teve. Assim, cada aluno fez um trabalho próprio, individualizado e original dentro de seus próprios limites e repletos de informações a seu respeito.

Como o professor X pôde dizer, então, que não havia originalidade? Porque utilizaram por certo, casas, árvores, flores, pessoas, animais?
Não importa se todos desenharam os mesmos elementos figurativos. Para cada aluno, a forma, o traço, o sentido ou contexto, a ordem, a cor trazem significados diferentes de um para outro.

Por outro lado, ninguém cria algo do nada. Nem Picasso, Van Gogh, ou Torricelli o fizeram. Inicialmente, suas obras partiram do conhecido de suas épocas e, aos poucos, a habilidade com o pincel permitiu que criassem algo que se transformou em originalidade. E para chegarem a isso, tiveram que aprender muito e trabalhar bastante.

Como o  professor X pode querer que seus alunos tenham o “virtuosismo” desses famosos?

A escola é um lugar de aprendizagens. A escola deve levar cada aluno ao desenvolvimento máximo de suas habilidades e capacidades (diz a LDB) ainda em estado de latência, por meio das aprendizagens.

Se o trabalho dos alunos é uma combinação de conhecimentos pessoais e de mundo em relação ao tema proposto, o professor X não pode afirmar que não houve originalidade, nem criatividade porque todos os alunos que cumpriram a tarefa. Desenvolveram seu intelecto, ultrapassaram barreiras e bloqueios pessoais e emocionais em relação ao tema proposto e, ainda, saíram fortalecidos psiquicamente. O que, com certeza, o infeliz comentário deve ter colocado todo esse trabalho a perder, pelo menos para alguns mais sensíveis ou sugestionáveis.

A questão do desenho foi apenas um exemplo prático do meu convívio pessoal. Mas, estas observações podem ser aplicadas em outras disciplinas, como numa produção de texto (Língua Portuguesa), numa resolução de problema (Matemática ou Física) ou numa resposta a uma pergunta (História, Geografia, Ciências ou Biologia).

Fica aqui o alerta para pais  e professores que agem dessa maneira.

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